De repente se descobre que a mensagem mediúnica é de péssima qualidade. De quem é a culpa?

As mensagens mediúnicas têm um tripé formado pelo espírito intencional, o médium interpretante e a mensagem final. Na impossibilidade real de haver um médium perfeito, capaz de recolher a mensagem na sua fonte sem nenhum tipo de influência sua sobre essa mensagem, a análise se apresenta como necessária quando se trata de considerar o valor da mensagem. Acrescente-se a noção kardequiana do Espírito, como sendo aquele que tem seus conhecimentos limitados à sua evolução.

As partes presentes no tripé mediúnico – espírito, médium, mensagem – pedem atenção no momento da análise. Outros elementos devem ser considerados, também, mas podem ser colocados em posição de espera até que o tripé seja compreendido*.

O médium está literalmente no centro do processo mediúnico. O contato é feito com ele ou ele faz o contato com o comunicante. A expressão atribuída a Chico Xavier de que “o telefone toca de lá para cá” não deve ser vista como imperativa. Não, segundo Kardec. O médium também pode teclar para o Espírito. Kardec entendeu desde cedo a noção de comunicação como diálogo cujo equilíbrio se traduz por poder igual das partes comunicantes.

De volta. A centralidade do médium no processo implica que ele é o homem do contato, mas também o homem da interpretação das ideias do Espírito. E, ainda, coautor da mensagem. Explica-se: o espírito intencional deseja transmitir ideias sobre temas de sua preferência e, como se sabe, precisa da palavra ou da linguagem que funciona como código a ser lido pelo médium. Daí haver Kardec dito que o médium é um intérprete do Espírito.

A capacidade de interpretar, portanto, surge na essência do processo. Neste momento, pode-se perceber a complexidade da questão. O Espírito apresenta suas ideias e o médium as recolhe, mas não como quem recolhe um pedaço de papel escrito. O médium “lê” essas ideias e diz para si mesmo o que elas significam. É o processo comunicativo com todas as implicações de uma comunicação baseada em símbolos linguísticos, com significados semânticos e contextuais.

Interpretar é função desafiadora, que vai terminar quando a mensagem é elaborada, outra função do médium. É, pois, na mensagem que está a chave da interpretação que o médium realiza. Ao escrever essa mensagem ele está dizendo o que entendeu do que lhe “disse” o Espírito comunicante. Se essa visão do processo mediúnico não recobre todo o espectro da mediunidade, alcança grande parte da psicografia, da psicofonia e da pintura mediúnica, os três tipos mais praticados na atualidade.

Se a mensagem entregue pelo médium ao leitor contém a ideia do Espírito, não deixa de ter também a ideia do médium. Em que medida uma é maior do que a outra ou que percentual pode-se atribuir a um e outro é a análise que poderá dizer.

Sabe-se por Kardec que há mensagens para as quais o Espírito intencional contribuiu apenas com a ideia central, deixando ao médium o desenvolvimento do texto. Nesse caso, a estrutura textual é toda do médium, assim como pertence a ele, médium, o estilo e a responsabilidade pelo conteúdo.

No limite, temos mensagens que podem ser ricas de informações a ponto de se poder identificar o autor espiritual pelo estilo e até mesmo pela assinatura, além das ideias expressas na mensagem. Casos como esses são menos comuns, certamente porque dependem de uma harmonia rara entre o Espírito intencional e o médium interpretante no momento mediúnico, harmonia essa que é também oscilante: se alcançada num primeiro momento, pode não o ser no seguinte.

O conhecimento do processo de comunicação mediúnica ou mecanismos da mediunidade contribui bastante para uma análise consistente da mensagem. O Espírito comunicante tem sua parcela de responsabilidade pelas ideias que fornece e o médium igualmente a sua pela capacidade de interpretar essas ideias, mas quando se trata de mensagem pronta e publicada, a responsabilidade final passa ao destinatário, leitor ou ouvinte, pois este é que vai fazer uso do conteúdo.

A análise, portanto, não é requisitada para estabelecer culpados no caso de mensagens sem qualidade, como também não se destina a consagrar o autor e o médium no caso contrário. Sua finalidade é determinar ao leitor ou ouvinte se a mensagem lhe serve ou não e isso é responsabilidade dele, destinatário.

Evidentemente, mensagens vindas por médiuns respeitáveis e assinadas por Espíritos cujas ideias são conhecidas por sua elevação apresentam possibilidades de aceitação maior. Igualmente aquelas que recebem a aprovação de líderes e dirigentes com credibilidade. Daí por que quanto mais respeitáveis são os médiuns e os Espíritos, bem como os líderes e dirigentes, maiores são suas responsabilidades perante o leitor ou ouvinte.

Espíritos jamais deveriam apresentar ideias de baixa qualidade. Médiuns nunca deveriam publicar mensagens de teor ruim. E líderes e dirigentes jamais deveriam dar o aval às produções mediúnicas de origem duvidosa. Mas quem é capaz de impedir que isso ocorra? Todos são livres para decidir por suas ações, adesões, ideias afins. E liberdade é a única garantia que existe para a formação da responsabilidade.

Portanto, ninguém pode substituir o leitor ou ouvinte na análise e na decisão quanto ao valor da mensagem. É dele e de mais ninguém essa responsabilidade. Mesmo quando alguém, influenciado por líderes, dirigentes ou médiuns, resolve dar crédito a uma mensagem dispensando-se da análise e confiando na daqueles que lhe antecederam, a decisão última é deste. O ônus ou o bônus resultante dessa decisão não se destinará a outro que não seja o leitor ou ouvinte, que chamamos de destinatário final da mensagem.
* Leia mais sobre o assunto no livro “Os Espíritos falam. Você ouve?”, de Wilson Garcia, Editora EME, Capivari, SP.